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Governo diz que não vai ‘destruir valor’ dos projetos de petróleo e gás. Especialistas veem risco de judicialização. Tubulação de gás natural em estação da Petrobrás em Alagoas
Assessoria
O governo publicou na segunda-feira (26) um decreto que promete baratear o gás natural por meio de um “choque” de oferta. A intenção é aumentar a produção do insumo, dando mais poder à agência reguladora.
A Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) vai poder determinar o aumento da produção em campos de petróleo e gás natural que já estejam em desenvolvimento e estabelecer níveis máximos de reinjeção (veja mais aqui)
Essas medidas têm sido encaradas pelas petroleiras como uma intervenção do governo no setor privado.
Em nota na sexta-feira (30), o Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) disse ver a norma com “preocupação”. Segundo a entidade, que representa as grandes petroleiras, o decreto “tem o potencial de gerar insegurança jurídica e elevar a percepção de risco”.
Do lado da indústria de transformação, no entanto, o decreto foi bem recebido. O gás é usado nas atividades industriais como matéria-prima ou fonte de calor na fabricação de produtos, e um aumento de oferta ajudaria a baratear o insumo.
Entenda a controvérsia (clique na pergunta para ser direcionado à resposta):
O que prevê o decreto?
Por que o risco de intervenção?
O que diz o governo?
O que diz a indústria?
O que prevê o decreto?
O texto dá mais poderes para a ANP, que vai passar a determinar índices máximos de reinjeção de gás natural para os campos e determinar o aumento de produção do insumo.
O decreto prevê, entre outros pontos, que a agência poderá:
determinar, mediante consulta prévia às empresas, a redução da reinjeção de gás natural ao mínimo necessário;
determinar, após ouvir as empresas, o aumento da produção de gás natural para campos em produção, inclusive os campos maduros (que produzem há mais tempo);
limitar a exportação de gás, quando observar que a produção não é suficiente para atender à demanda interna;
estabelecer remuneração “justa e adequada” para os donos de infraestruturas de gás (como gasodutos e “refinarias”) para permitir o acesso de terceiros.
No Brasil, a maior parte da produção de petróleo e gás natural é associada. Ou seja, para produzir petróleo, é preciso produzir gás.
Dessa forma, as petroleiras só têm duas escolhas: comercializar o gás ou injetá-lo novamente nos poços –processo chamado de “reinjeção”.
No pré-sal, os índices de reinjeção vêm batendo recordes, acima dos 50%. O governo considera que esse volume não se dá por motivos exclusivamente técnicos, e vê espaço para redução dos níveis e consequente aumento da produção.
Por que o risco de intervenção?
O advogado Rodrigo Mariani, do escritório BMA Advogados, destaca que o “caráter intervencionista” do decreto reside na determinação para que a ANP estabeleça níveis de reinjeção e aumente a produção dos campos.
“São duas coisas que [caracterizam] um poder de intervenção inédito, acho eu, no plano de negócios, e acaba afetando efetivamente os planos de investimentos e desenvolvimento dos campos”, declarou.
Ao decidir produzir petróleo e gás em um campo, a petroleira avalia critérios como volume de produção esperada, projeção de preço e investimento em infraestrutura.
“Ele [o empresário] vai fazer uma série de contas de investimento versus retorno. E nessas contas entra naturalmente a produção de petróleo, que é o hidrocarboneto mais valioso, mais ‘desejado’ pelo mercado, e claro que nessa conta é considerada também a taxa de reinjeção de gás”, explica.
O advogado afirma que a edição do decreto pode configurar algo chamado de “desapropriação indireta”.
Ou seja, a empresa continua como titular do campo, mas “o governo intervém de forma tão relevante que pode afetar o valor econômico daquela concessão, daquele projeto”.
Para o advogado Giovani Loss, do escritório Mattos Filho, o decreto desconsidera os aspectos econômicos dos projetos de petróleo.
“O decreto traz essa insegurança de o quanto o governo será sensível aos economics [aspectos econômicos] do projeto e o planejamento que a empresa já tem para aquele projeto. As empresas hoje não têm como saber o que o governo vai efetivamente, da forma como está feito o texto, forçá-las a fazer no contexto do projeto”, declarou.
Loss vê ilegalidade na edição do decreto. “Você ter o governo interferindo nesse planejamento, da forma como foi colocado, para mim, isso é ilegal”, disse.
Os dois especialistas citam o risco de judicialização da medida. Loss, inclusive, disse já ter sido procurado por empresas interessadas em questionar o decreto na Justiça.
O que diz o governo?
Primeira usina de gás natural da região Norte é inaugurada no Pará
Na segunda-feira (26), o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que o decreto é “completamente convergente” com a Lei do Gás, publicada em 2021.
“A manutenção da possibilidade de o órgão regulador e de o formulador de política pública, através de estudos técnicos, poderem reavaliar a reinjeção do gás por parte das petroleiras que exploram petróleo no Brasil é uma política pública efetiva”, declarou o ministro.
Para Silveira, o conteúdo do decreto está “implícito” na Lei do Gás. “[Se] Interpretar da forma adequada à Lei do Gás, vai se chegar boa parte no decreto que foi estabelecido agora”, disse.
O secretário de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, Pietro Mendes, afirmou na segunda-feira (26) que o governo não quer “destruir valor” dos projetos.
“A gente não vai, obviamente, destruir valor, a própria arrecadação da União, propondo ou projetos que diminuem o VPL [valor presente líquido] e por consequência diminuem a arrecadação”, declarou.
O que diz a indústria?
Para a indústria de transformação, grande consumidora de gás natural, a medida do governo foi positiva.
O presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim) e vice coordenador do Fórum do Gás, André Passos, afirma que o texto “é um dos melhores instrumentos de regulação de mercado de óleo e gás natural das últimas duas décadas”.
O gás é um insumo importante para a indústria química. Em alguns segmentos, o preço ideal do insumo gira em torno de US$ 5 por milhão de BTU (unidade de medida do gás), enquanto ele é vendido pelo dobro do preço, segundo Passos.
“Esse decreto é um instrumento que vem aperfeiçoar a regulação de um mercado que tem diversas assimetrias de informação, porque tem vários pontos que não são totalmente transparentes, e o impacto dessas assimetrias sobre os preços”, declarou.
A Associação dos Grandes Consumidores de Energia (Abrace) disse que o texto é uma oportunidade para definir o papel da União no aumento da oferta nacional.
“Estamos confiantes de que os desdobramentos das medidas traduzidas neste decreto trarão equilíbrio às discussões, e preservarão direitos do setor e o interesse dos agentes em novos investimentos”, declarou.
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