Copom: por que o mercado continua a esperar novas altas da Selic? Entenda
Próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) acontece na próxima quarta-feira (5). Estimativa do mercado é de nova alta da taxa básica de juros. O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, durante sessão no Senado
Adriano Machado/Reuters
As dúvidas sobre a situação das contas públicas brasileiras e a perspectiva de uma atividade econômica que continuará forte devem continuar a pesar nessa e nas próximas decisões de juros do Banco Central (BC).
O Comitê de Política Monetária (Copom) se reúne nesta semana, e anuncia a nova taxa básica do país na quarta-feira (6). A Selic está em 10,75% ao ano, e a expectativa dos economistas e agentes do mercado financeiro é que ela sofra um novo aumento de 0,50 ponto percentual.
E não termina por aí: a maior parte dos economistas ainda prevê uma nova elevação, da mesma magnitude, da taxa básica na reunião de dezembro. Assim, a Selic terminaria 2024 na casa dos 11,75% ao ano, maior patamar desde janeiro.
O BC precisa analisar duas faces da economia brasileira:
De um lado, o crescimento melhor do que o esperado do Produto Interno Bruto (PIB) e um mercado de trabalho em mínimas históricas ajudam o consumo, mas pressionam as expectativas de inflação.
Por outro, o governo com dificuldades em mostrar a credibilidade do arcabouço fiscal, o que deixa investidores aflitos e os faz pedirem juros mais altos para investir no país.
Entenda melhor as questões abaixo, e saiba o que esperar do Copom.
Por que teremos novas altas da Selic?
Segundo economistas consultados pelo g1, uma série de fatores tem influenciado a percepção do mercado de que o Copom precisará adotar uma postura mais dura na condução dos juros, subindo as taxas. Entre eles estão:
A maior incerteza sobre as contas públicas do país;
A atividade econômica aquecida e a consequente pressão inflacionária; e
O cenário internacional, também mais incerto.
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Incerteza sobre as contas públicas do país
De acordo com os especialistas, a dúvida sobre a capacidade do governo em cumprir com suas metas fiscais é um dos principais fatores avaliados pelo mercado nos últimos meses.
“O fiscal é uma estatística macroeconômica importante e que entra de forma indireta nas expectativas de inflação”, explica o economista do ASA Leonardo Costa.
Recentemente, o destaque das discussões econômicas tem sido a promessa feita pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de que a equipe econômica apresentaria novas medidas de cortes de gastos após as eleições municipais de 2024.
O ministro ainda não detalhou as medidas nem indicou quando elas devem ser anunciadas. O governo federal tem a meta de zerar o déficit público neste ano, e mercado espera que o pacote que determine cortes entre R$ 50 bilhões e R$ 60 bilhões para cumprir a promessa, segundo informou o blog do Valdo Cruz.
Segundo o economista-sênior do Banco Inter André Valério, a expectativa em torno desse valor leva em consideração o quanto seria necessário para que o governo conseguisse cumprir com o que prometeu, sem derrubar o arcabouço fiscal, para este e para o próximo ano.
“Se o governo vier com um corte menor do que esse ou com medidas menos transparentes, pode ser que eleve a percepção do mercado de que o arcabouço não será levado tão a sério”, diz o economista.
O tema também tem sido abordado de maneira frequente pelo próprio BC, como um fator de influência nas decisões de política monetária.
Nas últimas semanas, por exemplo, o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, voltou a afirmar que se o Brasil quiser ter juros estruturalmente mais baixos, precisará apresentar medidas que sejam interpretadas como um choque fiscal positivo.
“Tem que ser algo que produza uma mudança nas expectativas que seja grande o suficiente para reverter o prêmio de risco, a expectativa de inflação e a curva longa de juros, e isso alimentaria a função de reação [do BC] de maneira positiva”, disse ele, no final de outubro.
Para o estrategista de macroeconomia do BTG Pactual Portfolio Solutions Álvaro Frasson, mais do que um valor específico de cortes de gastos, o mercado espera um “plano de voo” por parte do governo, que indique um roteiro concreto e factível para estabilizar a dívida pública.
“Não estou falando que o mercado quer a estabilidade da dívida em relação ao PIB para hoje, mas o mercado quer um plano de voo. Claro que um dos fatores para chegar a esse cenário é um custo de refinanciamento mais baixo, mas esse custo não se baixa com Selic, e sim com credibilidade do lado fiscal”, afirma.
Economia aquecida e pressão inflacionária
O forte desempenho econômico do país ao longo nos últimos meses é outro fator observado pelo BC.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que o Produto Interno Bruto (PIB) do país cresceu 1,4% no segundo trimestre deste ano, no 12º resultado positivo do indicador.
Somado a isso, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua indicou na semana passada que a taxa de desemprego do país estava em 6,4% em setembro, na segunda menor taxa de desocupação da série histórica.
“Há uma percepção de que a economia está mais forte do que o esperado ou de que a desaceleração está acontecendo bem aquém das expectativas. Tudo isso faz com que a projeção [de inflação] do BC não alcance o centro da meta. Por isso, começamos um novo ajuste [de alta de juros]”, afirma a economista-chefe da SulAmerica Investimentos, Natalie Victal.
Esse, no entanto, não é o único fator de pressão inflacionária no país. Pontos como a forte alta do dólar – que já acumula ganhos de mais de 20% no ano – e a pressão mencionada acima, das contas públicas, também aumentam as expectativas de inflação e fazem com que o mercado projete novas altas de juros à frente.
“Mas não é só a política monetária que define qual o patamar da inflação, é a política econômica como um todo. E são vários fatores. Temos a política monetária do BC, a política fiscal do governo e a política setorial, por exemplo, que afetam esse cenário”, explica Victal.
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Cenário internacional
Por fim, há a incerteza da economia global. Em primeiro lugar, os dados ainda são fortes na economia norte-americana, que sugerem que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) deve diminuir o ritmo de cortes de juros por lá.
Juros maiores (e por mais tempo) nos Estados Unidos aumentam a rentabilidade dos títulos do Tesouro norte-americano (as Treasuries), considerados os ativos financeiros mais seguros do mundo. Assim, quem busca segurança e boa remuneração em momentos turbulentos prioriza o investimento por lá e se afasta dos emergentes, como o Brasil.
Com o fluxo de dólares direcionado para os Estados Unidos, a taxa de câmbio tende a piorar por aqui, piorando também a inflação local.
Além disso, especialistas ainda citam as eleições norte-americanas como um fator de risco importante para a moeda brasileira e, possivelmente, para a curva de juros do país.
“Além do componente de uma atividade mais forte nos Estados Unidos, temos também o fator eleição. A agenda do ex-presidente Trump é vista como expansionista, o que pode trazer juros mais altos no país e uma valorização do dólar ante o real”, diz Victal.
O que o mercado espera ver no comunicado?
Segundo os economistas, o Copom deve adotar um discurso um pouco mais cauteloso no comunicado divulgado após a decisão.
“A gente acha que vai vir um comunicado no sentido de enfatizar a incerteza no cenário externo e doméstico”, afirma Valério do Inter.
Além disso, a estimativa é que o colegiado não se comprometa com os próximos passos na condução da política monetária.
“Acreditamos que o BC vai deixar os próximos passos em aberto porque ele tem conseguido ancorar a precificação do mercado só com declarações. E quando você escreve em um documento, bem ou mal, você tem um compromisso. E desfazer esse compromisso gera um custo”, completa Victal.
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