'Black Monday': entenda o que aconteceu com o dólar e se a moeda pode chegar a R$ 6
A alta do dólar vem desde junho, mas se intensificou nos últimos dias, em meio ao receio de uma recessão econômica nos Estados Unidos. Moeda norte-americana fechou em alta de 0,56%, cotada em R$ 5,7412, no maior patamar desde dezembro de 2021. Cédulas de dólar
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Agosto mal começou, mas os presságios são de um mês conturbado para o dólar. Em cinco dias, a moeda norte-americana já acumula uma valorização de 1,54%, já tendo alcançado a maior cotação desde 2021. No ano, a moeda sobe 18,31%.
A alta do dólar vem desde junho, mas se intensificou nos últimos dias, em meio ao receio de uma recessão econômica nos Estados Unidos. Os temores de que haja uma queda brusca da atividade econômica nos EUA levam o mercado financeiro a recalcular suas apostas.
Os investidores deixam de apostar em ações, por exemplo, pois os lucros se retraem. O fluxo de dinheiro, portanto, sai da bolsa de valores ou dos investimentos diretos, para ativos mais seguros. É o caso dos títulos de dívida americana (as Treasuries), considerados os mais seguros do mundo.
Pelo tamanho da economia americana, esse “caminho do dinheiro” é replicado em escala global. Isso afeta as bolsas de outros países e dá força ao dólar.
Especialistas ouvidos pelo g1 dizem que a reação dos mercados aos primeiros indícios de recessão nos EUA foi exagerada nesta segunda-feira (5), mas ainda há espaço para que o dólar bata os R$ 6 caso o cenário local e internacional se deteriore. (saiba mais abaixo)
Entenda o que impulsionou o dólar e os fatores que podem piorar a situação.
O que aconteceu com o dólar?
Nesta segunda-feira (5), o dólar fechou em alta de 0,56%, cotado em R$ 5,7412, renovando o maior patamar em dois anos e meio.
Há uma série de fatores que podem explicar a forte valorização que o dólar tem registrado desde a semana passada.
Entre eles:
A preocupação com uma possível recessão nos Estados Unidos;
O cenário geopolítico global e a queda nos preços das commodities;
A forte valorização do iene;
A continuidade das preocupações com o quadro fiscal brasileiro.
➡️ Recessão nos Estados Unidos
Na última sexta-feira (2), o payroll, um dos principais relatórios do mercado de trabalho norte-americano, reportou a criação de 114 mil vagas fora do setor agrícola nos EUA em julho.
O número não apenas representa uma desaceleração em comparação ao mês anterior, quando o país criou 179 mil postos, como também veio abaixo do esperado pelo mercado, que projetava 175 mil novas vagas em julho.
O setor privado gerou 97 mil postos de trabalho, a segunda menor leitura desde dezembro de 2020. Com isso, a taxa de desemprego subiu para 4,3% (ante 4,1%).
O resultado ainda se somou a outro dado de emprego que veio aquém do esperado no país, na última quinta-feira (1º). Os pedidos iniciais de auxílio-desemprego nos EUA aumentaram em 14 mil na semana encerrada em 27 de julho, para 249 mil. É um pico nos últimos 11 meses.
Esses indicadores sugerem um enfraquecimento do mercado de trabalho norte-americano e reforçam a perspectiva de que o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) deve começar a cortar os juros no país em breve.
Na semana passada, o Fed decidiu mais uma vez manter as taxas de juros inalteradas nos EUA, mas abriu a porta para uma possível redução dos juros na próxima reunião da instituição, em setembro.
O Fed não se sentiu confortável até o momento para reduzir as taxas, pois buscava levar os índices de inflação de volta para a meta de 2%. O índice está atualmente em 3% na janela de 12 meses, e a avaliação era que o mercado de trabalho aquecido poderia gerar mais pressão nos preços.
Agora, porém, o temor dos investidores é de que o esforço do BC americano para frear a inflação sem causar uma recessão tenha falhado.
Segundo o economista da XP Francisco Nobre, os dados do mercado de trabalho norte-americano acabaram minando uma possível variação positiva dos ativos brasileiros.
“Isso acabou trazendo uma preocupação adicional sobre uma possível recessão nos Estados Unidos, e todo aquele otimismo que seria criado em torno das moedas emergentes, foi revertido”, disse o economista.
➡️ Cenário geopolítico global e preço das commodities
Na semana passada, houve uma piora do ambiente geopolítico global, com a escalada da tensão no Oriente Médio.
O chefe do grupo terrorista Hamas Ismail Haniyeh foi morto na quarta-feira (31) em Teerã, no Irã. Mesmo sem que o governo israelense tivesse assumido a autoria pela morte, o líder supremo iraniano, aiatolá Ruhollah Ali Khamenei, prometeu “punição severa” ao país.
“Guerras costumam ser ruins para atividades de maneira geral. Se a gente tiver uma guerra, de fato, envolvendo Israel, talvez essa precificação de juros mude um pouco porque essa guerra seria inflacionária”, afirmou a economista-chefe da B.Side, Helena Veronese.
Além disso, a queda nos preços das commodities vista nos últimos meses também ajudou a pressionar o real para baixo.
“A leitura do mercado é que quando vai o preço dessas mercadorias, o Brasil, ao exportar, vai receber menos dólares para a quantidade exportada. E o câmbio nada mais é do que a referência de como está o fluxo de dólar que entra e o que sai do país”, explicou o sócio-fundador da Fundamenta Investimentos, Valter Bianchi Filho.
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➡️ Valorização do iene
Os especialistas também destacam a forte valorização que o iene vem demonstrando nas últimas semanas. A moeda japonesa se valorizou de 162 ienes por dólar em julho para 141,73 ienes por dólar nesta segunda-feira, no maior nível desde janeiro.
O movimento foi, em parte, impulsionado pelo aumento das taxas básicas de juros no Japão por parte do banco central local na semana passada, para 0,25% ao ano. Além disso, o BC do Japão passou a reduzir as compras mensais de títulos para dar força à moeda.
Com juros baixíssimos no Japão — em especial enquanto os juros subiam em outras economias desenvolvidas —, agentes do mercado financeiro apostaram alto nas operações de “carry trade”.
Funciona assim: investidores fazem dívida em países com juros baixos e aplicam os recursos em economias que oferecem remuneração maior. Captando a juro baixo e aplicando a juros mais altos, a rentabilidade da operação vem da diferença entre as taxas de juros.
Com o aumento de juros por parte do Banco do Japão, no entanto, houve uma redução do diferencial de juros. Isso aumentou o risco e reduziu a rentabilidade das operações de carry trade, gerando um desmonte em massa das posições. O movimento acaba fortalecendo o iene, e prejudicando outras moedas.
“Uma posição que muitos hedge funds [fundos de proteção] estavam fazendo era ficar vendido em iene e comprado em real. […] Com essa supervalorização do iene, os hedge funds tendem a zerar esse tipo de operação, e é por isso que o real também tem sofrido”, afirmou o superintendente de tesouraria do Travelex Bank, Marcos Weigt.
➡️ Fiscal brasileiro
Por fim, os especialistas ainda mencionam a continuidade das preocupações com o quadro fiscal brasileiro. O mercado continua em dúvida sobre a capacidade de o governo federal em controlar as contas públicas.
Na semana passada, por exemplo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o governo estuda uma proposta de tributação sobre o lucro de multinacionais, em mais uma tentativa de aumentar a arrecadação federal para conseguir cumprir a meta fiscal.
A crítica dos mercados, no entanto, é de que as medidas anunciadas pela equipe econômica atacam principalmente a parte das receitas, e que seria necessária uma ofensiva mais forte também do lado das despesas.
Assim, mesmo o governo tendo anunciado recentemente um congelamento de R$ 15 bilhões, a avaliação é de que mais cortes de gastos serão necessários.
“É isso o que o mercado interpreta. Se o governo não demonstra que vai conseguir cuidar das contas do país, o Brasil vai continuar com inflação e juros altos, e com um baixo crescimento. Isso vai virando um ciclo vicioso”, disse Bianchi Filho.
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O dólar pode chegar a R$ 6?
Segundo especialistas, apesar da leitura de que a reação dos mercados foi exagerada nesta segunda-feira, ainda há espaço para que o dólar bata os R$ 6 caso o cenário local e internacional se deteriore.
Ou seja, se houver uma piora da preocupação de uma eventual recessão nos Estados Unidos, a continuidade de queda nos preços das commodities ou um agravamento do quadro fiscal brasileiro, a moeda norte-americana pode, sim, alcançar uma valorização ainda maior.
“Essas previsões são difíceis de fazer. É necessário entender a função de reação dos mercados. Com commodities mais baixas, por exemplo, o câmbio local também tende a baixar. Mas se houver uma descompressão do fator doméstico, isso pode ajudar a segurar o câmbio no lugar. Uma coisa compensa a outra”, disse Bianchi Filho.
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